quinta-feira, 27 de setembro de 2007

TRIGÉSIMO DIA, Quarta-feira, 26 de Setembro de 2007.

Hoje percebemos que a obra está interferindo seriamente nas nossas reações, o que enriquece muito o trabalho. Estamos sentindo na carne os efeitos de estarmos presos entre grades. Estamos irritados e nos obrigamos a ser gentis e naturais com as pessoas, que, afinal, não têm culpa nenhuma por termos criado esta obra. Refletimos muito sobre todos estes efeitos, e ficamos nos perguntando o quanto essa realidade (porque antes deste trabalho ser arte, ele é o reflexo de uma realidade) estaria afetando a nossa sociedade.

Enquanto tomamos nosso café da manhã, nossa amiga da loja em frente vem conversar. Conta que ontem assistiu à entrevista que demos à TVE, sobre o nosso trabalho e que reuniu a família para jantar, sobre a cama, para ver. Aproveita para dizer que LAR DOCE LAR nenhum é completo sem filhos, que precisamos ter filhos logo. O pessoal todo da loja faz campanha para que tenhamos filhos.

“O que acontece com tudo o que pertence à obra depois?” – Pergunta alguém. Esta obra só existe enquanto está aqui, enquanto estamos aqui. Depois, fica este registro em palavras e a lembrança de quem viu, as fotos, o livro de visitas, os vídeos, a música, nós. As sensações.

Dois amigos vêm visitar a instalação e inicia uma conversa que se estende por alguns minutos. O incômodo de quem está de pé, do outro lado, é também uma armadilha. Enquanto há grades entre as pessoas, há incômodo. Além do psicológico, as pernas doem, não há contato físico, é impossível beijar ou abraçar na despedida.

Questionamos o motivo de algumas pessoas não se aproximarem dos fones.

Além do simples “não estar com vontade”.

Timidez...

Medo de não corresponder às nossas expectativas, não ter a reação que esperamos...

Medo de interagirmos de maneira incômoda, com alguma surpresa desagradável ou assustadora...

Medo do inesperado...

Medo que cobremos...

Medo.

Hoje, ouvi: “coragem não é a ausência do medo, mas a capacidade de enfrentá-lo”.

Hoje senti perturbações visuais, que julgo serem por estresse. Por alguns segundos, senti como se meus olhos não conseguissem fixar a imagem. Resolvi fechando os olhos por uns segundos e respirando fundo.

Fugimos para almoçar. Estamos no nosso limite, preferimos sair de cena por quinze minutos e comermos num restaurante da praça de alimentação. Foi necessário para a nossa saúde mental e para podermos ficar bem durante a tarde.

“Significa o estar isolados, distantes uns dos outros, solitários?”

“As pessoas estão entre grades por medo de ladrão, medo de não pagar as contas, medo da falta de dinheiro...” – Ouvimos de um espectador. Novamente, o medo.

Duas amigas vêm nos visitar. Percebemos que as pessoas estão vindo ver o trabalho e ficando, conversando. Pergunto às visitantes, uma artista e a outra psicóloga, o motivo que as levou pararem para conversar. “O lugar é aconchegante e receptivo”.

“É como se eles estivessem na casinha deles, viu? Ela tá no computador trabalhando, e ele, vai jogar um vídeo game!”

“Eu pensei que vocês não podiam sair daqui!” – A gente sai, mas de colete a prova de balas! – Responde o Beto.

“Vocês devem estar felizes porque realizaram uma loucura de vocês...”

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