quarta-feira, 5 de setembro de 2007

QUINTO DIA Sábado, 01 de Setembro de 2007.

Movimento intenso desde cedo no shopping. Visitação no primeiro minuto em que ligamos os “passarinhos”. A “vizinha” da loja Lua nos trouxe um café com leite, com pão caseiro e manteiga! Hummmm...Fazia dias que não tomávamos nada quente!

Descobrimos uma forma mais prática de limpar o nosso LAR DOCE LAR. O sistema antigo da “feiticeira”, aquele sistema de rolinho, que se passava nos tapetes quando nem todo mundo tinha aspirador de pó. Nosso lindo tapete preto de pele acrílica ficou novinho novamente. Já estava ficando cheio de farelos. O Beto foi de pijama e pantufas comprar nosso sistema limpador, numa loja aqui dentro do shopping, sob o olhar de estranhamento de quem passava por ele e não entendia nada. Esta é uma outra face deste trabalho: enquanto as pessoas passam apressadas pela nossa jaula, nós estamos nos nossos pijamas, muitas vezes no meio da tarde, lendo tranqüilamente, bocejando... Nos permitindo fazer coisas que o homem contemporâneo, na maioria das vezes, não se permite. Isso tudo acontecendo aqui, no que se pode chamar templo do capitalismo, onde “time is money”...

Duas irmãzinhas vieram ver a exposição da Barbie, que está ao lado da nossa instalação. A mãe das meninas me encontrou durante minha curta fuga ao banheiro para escovar os dentes e perguntou se eu fazia parte da exposição das Barbies. As meninas tinham dito a ela que eu era uma boneca gigante, que me movimentava como uma boneca, ao que ela respondeu que achava que não, mas as crianças insistiram que sim. Me senti a própria bruxinha de pano, descabeladinha e esfarrapada, ao lado das Barbies lindíssimas, produzidíssimas, com seus cabelinhos impecáveis de chapinha. Uma das coisas mais belas de uma obra de arte é poder despertar as mais diversas interpretações e gerar reflexão... A das meninas foi tão mágica e inocente quanto a realidade delas.

Ouvindo os passantes:

“O que é isso?”

“Tem até cachorro!”

“Eles estão ouvindo alguma coisa! Quero ouvir a música!”

“Ali, ó, ele (o Beto) pegou aquela moça e agora vai pegar vocês, hein?” – Mãe assustando os filhos para não chegarem perto das grades.

“O que é isso?” “É o shopping com a bienal!”

“Com vídeo-game e computador é fácil!”

“Que horror isso aqui!”

Descubro que falta do que fazer gera mania de limpeza... Nem sei quantas vezes já limpei o tapete da instalação.

...Pensamos em usar coletes a prova de balas para ir ao banheiro.

...Daqui da minha sacada vip vejo a balança da farmácia... Como as pessoas se pesam!

Não consigo relaxar quando estou aqui... Sinto como se a minha alma estivesse exposta o tempo todo. Como quando fazemos um desenho e não queremos mostrar... Às vezes dá vontade de esconder essa instalação no bolso e sair correndo...! Essa tensão de expor um trabalho pode ser menor quando não se está dentro do trabalho... Mas acho que depois desta experiência vou ser uma pessoa melhor, mais corajosa de expor meu interior.

O computador pifou... Agora escrevo num caderninho, para passar a limpo depois... O Beto, tentando melhorias para nosso LAR DOCE LAR, tentava fazer uma modificação no sistema do lap top e deu errado... Ficamos sem computador por dois dias, até ele conseguir instalar o que queria... Ainda estamos na batalha para colocar Internet na jaula e facilitar nossas vidas.

A nossa ação afeta a leitura da obra. Enquanto o Beto jogava vídeo-game ouvi de um espectador, que apontava pra ele: “Crianças, esta é a vida inútil!”

Uma menina, de aproximadamente 5 anos, dança ouvindo a música. Os olhos noutra dimensão. Completamente inteira no que ouve, imersa no som. A canção acaba, ela pede à mãe para escutar novamente. Dança. Ouve até o final. Pega na mão da mãe e sai, explicando a ela o que tinha ouvido.

Fotografo as pessoas que nos observam e acontece a mágica: sou observada ou observador? Coloco os óculos escuros e passo a ser a espectadora de um show que nunca é o mesmo. Reações muito diversas, naturais, humanas. Ainda mais naturais do que as minhas, já que sei estar sendo observada. Pela primeira vez, em quatro dias, sinto uma tranqüilidade, e até prazer, em ver os olhos das pessoas na instalação e em mim. Espero conseguir uma concentração daqui por diante, para que o trabalho não seja tão sofrido como vinha sendo.

O sábado traz um olhar mais tranqüilo... Como se todos estivessem sem a pressa que vimos durante a semana. Este olhar é como um carinho no nosso trabalho e é muito boa essa sensação.

“Que irritante! “ Diz a menina depois que expliquei se tratar de uma obra de arte.

A interação física do público com a obra é muito próxima. Pessoas se penduram nas grades, colocam os braços pelos vãos, quase entram na jaula. Um contato que raramente se vê entre obra e espectador.

Coralistas da OSPA viram nosso trabalho e resolveram nos presentear com um pocket show. Pessoas pararam para ver e tudo se transformou num outro trabalho. Uma nova perspectiva.

Ganhamos chocolates de alguns amigos visitantes!

Fomos entrevistados por uma rádio de Buenos Aires!

Sábado foi o dia mais movimentado desde a abertura. E eu teria escrito muito mais, se o lap top não tivesse pifado!

Um comentário:

Jener Gomes disse...

Hum... a tal vida inútil é outra leitura... ao ignorar as grades. Não deixa de ter sua valia, né? Menor que a proposta de vocês, mas ainda bastante válida.

"Que irritante!" é ótimo!! Causou um grande desconforto!!! Nem toda percepção e mudança de estado mental é prazeirosa.

Coralistas da OSPA, que beleza!! O que cantaram?

Como ficou o computador? Na útima ligação o Beto não conseguia reinstalar o Windos 98... eu estou com o CD dele aqui.