domingo, 16 de setembro de 2007

DÉCIMO NONO DIA Sábado, 15 de Setembro de 2007.


Os seguranças, antes sérios e durões, já são todos nossos amigos. Nos dão “bom dia” sorrindo, fazem brincadeiras conosco, perguntam se podem entrar para jogar vídeo-game com o Beto, se podem entrar para tirar um cochilo... Viramos uma diversão para eles. Os funcionários das lojas mais próximas também: nos adicionam no orkut, mostram fotos dos filhos, oferecem o frigobar da loja para guardarmos nossa água. Esse convívio torna a nossa estada neste lugar mais humana, mais acolhedora. Antes, éramos estranhos, nos olhavam desconfiados, até amedrontados. Os seguranças rondavam nossa instalação como que para controlar qualquer atitude proibida que pudéssemos ter. Passado o perigo, tornamo-nos iguais: somos pessoas que, igualmente a todos eles, trabalham no shopping.

Percebi que, nos primeiros dias, os funcionários da loja em frente eram sérios, mesmo dentro da loja. Parece que se sentiam vigiados. Estavam diante de estranhos. Nos últimos dias, vejo-os conversando, rindo, mais tranqüilos, como se tivessem relaxados em relação à nós.

Senhoras dançam enquanto ouvem a música nos fones.

“É pra divulgar a música!” Diz uma delas. Será que alguém pensaria que a música estaria ali para divulgar a instalação? Porque a música tem mais força nesse caso?

Uma das coisas importantes deste trabalho é o nosso registro de gastos. Diariamente anotamos todos os gastos, guardamos as notas fiscais, fazemos uma estimativa para vermos se estamos dentro do que podemos gastar.

Visitantes amigos, Sérgio e Cristina estiveram aqui no meio de uma caminhada. Ouviram a música, à qual reagiram com entusiasmo e comentários positivos. Sérgio disse que estava ótimo, que fazia a gente pensar sobre o que está acontecendo, e que é isso mesmo... E que nós devíamos estar na Bienal, e não na Bienal B. Deixaram beijos para a Cláu e se foram.

Uma família se aproxima do LAR e um dos dois filhos do casal, uns 4 anos, começa a deslizar dois dedos na grade, seguindo as curvas dela. Aquele movimento lento e cadenciado começou a me cativar, como um vaivém hipnótico. Então a mãe colocou os fones de ouvido nele. Continuou naquele estado zen, com uma expressão facial de curiosidade relaxada. Me lembrou aquelas fotos do Dalai-Lama. E, depois de ouvir, ele tentou escalar a grade. Já isso me lembrou mais o Homem-aranha. Não é a primeira criança que tenta escalar a grade.

“Se não se comportar muito bem, vai ficar que nem ele”, uma mãe disse à filha, apontando para mim.

Mais visitas de amigos. O meu colega de colégio Renan e seu pai aparecem para dar um oi. (Inúmeros amigos aparecem diariamente, é até uma injustiça citar apenas alguns, mas aí o Beto escreveu a frase anterior e achamos melhor conservá-la.)

“Apareceu na TV!”, diz quase gritando uma adolescente, para as amigas.

“Porque eles estão aí, mãe?” – “É como se fosse uma gaiola.”

“Ô moço, isso é uma cadeia?” Não, é a nossa casa.

“Isso é pras pessoas ficarem menos em casa!” Explica um passante aos amigos.

“Vocês são ladrões? Ah, não? Ah, tá, que susto!” Pergunta um menino de uns cinco anos.

Interessante ouvir diversas línguas faladas pelos visitantes... Japonês (ou Chinês?), Alemão, Inglês, Francês, Espanhol! Há um americano que sempre passa, sorri e conversa conosco em inglês... Outro dia o encontramos quando chegávamos, pela manhã, ao shopping, e ele nos acenou da frente do hotel onde está hospedado e desejou-nos um “good job”!

Pessoas sorriem para nós como se nos conhecessem há anos...

“Só isso? Eu posso escutar de novo?” Diz uma menina que adorou a canção.

Eu e o Beto passamos muito do nosso tempo conversando e criando. “Uma boa idéia primeiro existe na imaginação.” Li isso em algum lugar.

Nos demos de presente uma linda banana-split! Funcionou maravilhosamente bem como cenário. Mas durou bem pouco. Dividimos-na, cada qual com a sua colher, sentados no chão, no meio da instalação, tal qual a Dama e o Vagabundo dividindo o spaguetti.

“Parece que passou um furacão, porque tem uma cadeira no teto!”, diz uma menina para a mãe.

Três moças que passavam param diante das grades. Olham por um segundo e, uma delas tira a sua conclusão: “Ah, já entendi, é o casamento!”

Ganhei docinhos do meu querido tio Ricardo, pelo meu aniversário. E, ao comentar sobre a tensão de estar o dia todo em público, aprendi com ele, que é músico da OSPA há mais de 20 anos: “Mesmo que haja um milhão de pessoas na platéia, cada pessoa é uma pessoa, então é como se houvesse, sempre, uma pessoa... Cada uma de um milhão, é uma.”

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